sábado, 18 de outubro de 2014

RAIVA: PRIMARISMO, TRANSTORNO EMOCIONAL E TERAPIA por Divaldo Franco pelo Espírito Joanna de Ângelis

Foto by Brett Walker - link: https://www.flickr.com/photos/brettwalker/


Raiva e primarismo



A raiva é um sentimento que se exterioriza toda vez que o ego sente-se ferido, liberando esse abominável adversário que destrói a paz no indivíduo. Instala-se inesperadamente, em face de qualquer conflito expresso ou oculto, desferindo golpes violentos de injúria e de agressividade.

Inerente a todos os animais, no ser humano, porque portador de vontade e discernimento, é responsável por transtornos que conseguem obscurecer lhe a razão e perturbar lhe o equilíbrio, produzindo danos emocionais de pequeno ou grande alcance, a depender da extensão e da profundidade de que se reveste.

Quando existe a primazia dos instintos agressivos, na contextura do ser, este, diante de qualquer ocorrência desagradável, real ou imaginária, rebolca-se na situação danosa, em agitação inconsequente, cujos resultados são sempre la­mentáveis, quando não funestos.

Predominando nele o instinto de arbitrária domi­nação, em falsa postura de superioridade, percebendo a fragilidade dessa conduta e a impossibilidade de impor-se, porque não considerado quanto gostaria, recorre ao me­canismo psicológico da raiva para exteriorizar a violência ancestral que lhe dorme no íntimo.

A semelhança de um incêndio que pode começar numa fagulha e trazer prejuízos incalculáveis pela sua ex­tensão, a raiva também pode ser ateada por uma simples insinuação de pequena monta, transformando-se em vul­cão de cólera destruidora, que avassala.

Há indivíduos especialmente dotados da facilidade de enraivecer-se, que alternam essa emoção com a psicastenia - palavra cunhada por C. G. Jung, como uma fraque­za psíquica responsável por um estado de astenia psíquica constitucional, com forte tendência para a depressão, o medo, a incapacidade de suportar desafios e dificuldades mentais...

A raiva produz uma elevada descarga de adrenalina e cortisol no sistema circulatório, alcançando o sistema nervoso central, que se agita, produzindo ansiedade e manten­do o sangue na parte superior do corpo, no que resultam diversos prejuízos para as organizações física, emocional e psíquica. Repetindo-se com frequência, produz o endurecimen­to das artérias e predispõe a vários distúrbios orgânicos... 

De alguma forma, a raiva é um mecanismo de defesa do instinto de conservação da vida, que se opõe a qual­quer ocorrência que interpreta como agressão, reagindo, de imediato, quando deveria agir de maneira racional. Porque tolda a faculdade de discernir, irrompe, desastrosa, assinalando a sua passagem por desconforto, cansaço e amolentamento das forças, logo cessa o seu furor...

O animal selvagem, quando perseguido ou esfaimado ataca, para logo acalmar-se, conseguido o seu objetivo.

O ser humano, além dessa conduta, agride antes, por medo de ser agredido, aumentando a gravidade de qual­quer ato sob a coerção do pânico que se lhe instala de mo­mento, ante situações que considera perigosas, evitando racionalizar a atitude, antes parecendo comprazer-se nela, sustentando a sua superioridade sobre o outro, aquele a quem atribui o perigo que lhe ronda.

O seu processo de evolução do pensamento e da consciência, porque estacionado nos remanescentes do período egocêntrico, ora transformado em egoico, estimula esse comportamento inoportuno e prejudicial, cujos efei­tos danosos logo serão sentidos em toda a sua extensão.

O círculo da raiva é vicioso, porque o indivíduo adapta-se a essa injunção, passando a gerar um compor­tamento agressivo, quando não vivenciando uma postura contínua de mau humor.

Essa raiva inditosa é resultado de pequenas frustra­ções e contínuas castrações psicológicas, muitas vezes ini­ciada na constelação familiar, quando pais rigorosos e im­prudentes, violentos e injustos, assumem postura coercitiva em relação aos filhos, impondo-se-lhes, sem a possibilidade de diálogos esclarecedores. Lentamente vão-se acumulando esses estados de amargura pela falta de oportunidade de defesa ou de jus­tificação, que se convertem em revolta surda, explodindo, indevidamente, quando já se faz uma carga muito pesada na conduta.

Por natural necessidade de afirmação da personalida­de, a criança é teimosa, especialmente por falta de discerni­mento, por necessidade de adquirir experiências, gerando atrito com os pais e familiares mais velhos, que nem sem­pre estão dispostos a conversar com esclarecimentos ou sa­bem como equacionar esses conflitos do desenvolvimento intelectual e emocional do educando.

Exigem silêncio, respeito, não permitindo as discus­sões francas e próprias para os esclarecimentos que se tor­nam necessários ao entendimento das situações existenciais e das possibilidades de ação, no que é ou não concernente a cada um cumprir. Também ocorre quando são genitores descuidados que não se interessam pelos problemas da prole, causando-lhe um fundo ressentimento, a princípio inconsciente, para desbordar em raiva acumulada.

Outras vezes, como resultado da timidez, o indiví­duo refugia-se na raiva, e porque não a pode expressar, foge para transtornos profundos que o maceram.

A falta de conhecimento das próprias debilidades emocionais faz que não disponha de equilíbrio para enfrentamentos, competições, discussões, derrapando facil­mente no comportamento infeliz da raiva.

Acidentes automobilísticos, em grande número, são resultado da raiva mal contida de condutores que não se conformam quando outrem deseja ultrapassá-los na rodo­via, nas ruas e avenidas, embora estivessem viajando em marcha reduzida. Sentindo-se subestimado pelo outro -raciocínio muito pessoal e sem fundamento — em vez de cederem a passagem, quando observam que o outro veículo se lhes emparelha, aceleram e avançam ambos, raivosos, até o surgimento de um terceiro em sentido oposto, obedecendo, porém, as regras, no que se transforma em tragédia. Bastasse um pouco de bom-tom, de serenidade, para cooperarem um com o outro, e tudo seria resolvido sem qualquer dano.

Durante os desportos, na política, na religião, na arte, participando ou acompanhando-os, não admitem es­ses aficionados a vitória do outro, a quem consideram adversário, quando é somente competidor, enraivecendo-se e dando lugar a situações graves, muitas vezes redundando em crimes absurdos.

A raiva é choque violento que abala profundamente o ser humano, deixando rastros de desalento e de infelicidade.

Ela está habitualmente presente nos debates domés­ticos, quando os parceiros não admitem ser admoestados ou convidados à reflexão por atitudes incompatíveis com a própria afetividade ou decorrentes de situações que sur­gem, necessárias para os esclarecimentos que facultem a melhora de conduta.

Em vez da análise tranquila do fenômeno, a tirania do ego exalta-o, o instinto de predominância do mais forte ressuma e a pessoa acredita que está sendo diminuída, cri­ticada, passando a reagir antes de ouvir, a defender-se antes da acusação, partindo para a agressão desnecessária, de que sempre arrepende-se depois. 


Raiva e transtorno emocional 

A raiva tem duas vertentes de procedência: a primei­ra, mais remota, que é de natureza espiritual, originária em existência pregressa do Espírito, quando, mais soberbo e primário, impôs-se onde se encontrava, desenvolvendo sen­timentos de opressão e de desrespeito aos direitos alheios, sempre desconsiderados; a segunda, de procedência atual, isto é, da existência presente, quando fatores temperamentais, educacionais, socioeconômicos empurraram-no à si­tuação penosa geradora de conflitos.

No primeiro caso, existe um conflito ancestral, que se encontra ínsito como culpa, armando-o para constante alerta, em mecanismo de autodefesa. O inconsciente impóe-lhe a tese falsa de que o mundo é-lhe hostil e as pessoas encontram-se equipadas de valores para submetê-lo ao seu talante.

No segundo caso, origina-se uma especial disposição para a instalação do conflito de insegurança psicológica desencadeador da raiva. Quando ocorre qualquer fato que não é entendido de imediato, sentindo-se incapaz de autopromover-se ou acreditando-se espezinhado, o complexo de inferioridade empurra-o para as atitudes grotescas e agressivas.

De bom alvitre, portanto, como terapia preventiva, manter-se o equilíbrio possível diante de qualquer acon­tecimento novo, inesperado, procurando entendê-lo antes que permanecer na defensiva, como se as demais pessoas se lhe estivessem agredindo, fossem-lhe adversárias e todo o mundo se lhe opusesse.

O acumular das pequenas raivas não liberadas termi­na por infelicitar o ser, afligindo-o emocionalmente e le­vando-o especialmente a transtornos depressivos, pela falta de objetivo existencial, por desinteresse de prosseguir na luta, fixando-se com revolta nas ocorrências que considera inditosas em relação a si mesmo.

Não poucas vezes, parceiros que sobrevivem no fluxo da existência corporal em relação ao outro que desencar­nou, acumulam raivas que se tornam ressentimentos, por não as haverem liberado quando se apresentaram em forma de frustrações e desagrados enquanto na convivência deles. Havendo a morte interrompido o ciclo da experiência fí­sica, aquele que permanece no corpo sente-se lesado, por haver sofrido sem necessidade, conforme supõe, por des­cobrir infidelidades que ignorava, por despertar do letargo que a união lhe impôs, passando a viver de ressentimentos profundos...

Sob outro aspecto, o ego exaltado rememora os mo­mentos felizes e enraivece-se ante o fato de haver sido mui­to amado e encontrar-se agora a sós, como se a morte hou­vesse resultado da opção do outro.

Nos suicídios, aqueles que ficam, em vez de compa­decer-se dos infelizes que optaram pela fuga, antes são do­minados pela raiva de se sentirem culpados ou não amados, ou não consultados antes do gesto, ruminando mágoas que se acumulam e terminam por intoxicá-los frequentemente.

A raiva tem o condão infeliz de envilecer o sentimen­to da criatura humana.

A sua constância responde por destrambelhos do sis­tema nervoso central, por disfunções de algumas das glân­dulas de secreção endócrina, por diversos problemas do apa­relho digestivo e pelo irregular comportamento psicológico.

Quando isso ocorre, invariavelmente surgem as somatizações que terminam, quando não tratadas cuidadosa­mente, em processos degenerativos de alguns órgãos. A culpa inconsciente domina grande número de criaturas humanas durante o seu trânsito carnal. Liberada pelo inconsciente profundo, o paciente considera que será punido e, quando isso não ocorre, assu­me uma das seguintes posturas:

a) Autopune-se, negando-se a alegria de viver, fugin­do de quaisquer recursos que podem torná-lo mais feliz, impedindo-se de relacionamentos afáveis, por acreditar não os merecer;

b) arma-se de agressividade para evitar aproximações ou para considerar-se vítima contínua dos artifícios maléfi­cos da Humanidade, conforme justifica-se.

Enquanto o Self não seja conscientizado da necessida­de de autoconhecimento, mediante o qual ser-lhe-á possível a identificação da culpa nos seus arcanos, e proponha—se a autoestima, o autorrespeito, a autoconsideração, ela vicejará cruel, disfarçada de ciúme - insegurança e autodesvalorização -, de infelicidade - complexo de inferioridade -, de in­veja - mesquinhez do caráter -, de autopunição — tormento masoquista -, ensejando que a raiva seja a companheira constante do comportamento arbitrário.

Tensões desnecessárias invadem o sistema emocional, como já referido, gerando desgaste improcedente, através do qual mais facilmente se instalam os distúrbios de comportamento, como fenômeno catártico que não pode mais ser postergado.

A raiva é um sentimento de desajuste da emotividade, que merece contínua vigilância, a fim de que não se trans­forme em uma segunda natureza na conduta do indivíduo.

Na raiz psicológica do sentimento de raiva existe um tipo qualquer de medo inconsciente que a desencadeia, le­vando o indivíduo a atacar antes de ser agredido, o que o tor­na, invariavelmente, violento e descompensado na emoção. De alguma forma, a insegurança do próprio valor e o temor de ser ultrapassado predispõem à postura armada contra tudo e todos, como se essa fosse a melhor maneira de poupar-se a sofrimentos e a desafios perturbadores.

Por consequência, os instintos primários predomi­nam orientando as decisões, quando estas deveriam ser controladas pela razão, que sempre discerne qual a melhor postura a assumir-se.


Terapia para a raiva

O ser humano processa o seu desenvolvimento intelecto-moral passo a passo, sem os saltos de largas conquis­tas. Superada uma etapa do processo antropossociopsicológico, surge outra igualmente desafiadora, que a experiência adquirida anteriormente lhe faculta superar.

Algumas vezes é natural que se equivoque, a fim de reiniciar o mecanismo autoiluminativo sem qualquer trau­ma ou desconforto, desde que a meta é o bem-estar, a con­quista da harmonia.

A incidência da raiva, portanto, é perfeitamente nor­mal, tornando-se grave a não capacidade de administrá-la.

De bom alvitre, sempre que invadido pelo desequi­líbrio dessa natureza, o paciente reserve-se a coragem de adiar decisões, de responder para esclarecer, de discutir em nome da autodefesa, porquanto, invariavelmente, o ego fe­rido precipita-o em postura inadequada de que se arrepen­derá de imediato ou mais tarde.

O silêncio diante de circunstância perturbadora, não se permitindo a invasão dos petardos mentais desferidos pelo opositor, constitui recurso imprescindível para evitar o tombo na irritação e seus consequentes danos.

O hábito, que deve ser cultivado, de considerar-se pessoa portadora de virtudes e de deficiências plausíveis de corrigenda, estando sujeita às variações do humor e de comportamento, susceptível de contrariedades, distonias, predispõe à vigilância. Se advertido, ouvir com atenção e avaliar a proposta apresentada, mesmo quando de maneira agressiva ou indelicada. Quando útil, incorporá-la como medida de sabedoria que lhe será valiosa, e identificando sub-repticiamente sentimentos negativos por parte do ou­tro, não lhe atribuir qualquer valor ou significado.

O exercício da paciência auxilia a aceitar a vulnera­bilidade de que se é constituído, não ampliando a irrupção da raiva quando ocorrer.

Tornando-se contínua, como resultado de estresse e de ansiedade, de insegurança e de medo mórbido, faz-se indispensável uma terapia psicológica, de modo a ser detectada a causa desencadeadora do fenômeno perturbador, que tende a agravar-se quando não cuidado de forma adequada.

A psicoterapia cuidadosa remontará a conflitos ador­mecidos no inconsciente, que tiveram origem no período infantil ou durante a adolescência, quando as circunstân­cias induziam à aceitação de situações penosas, sem o di­reito de explicação ou de justificação. As pequenas contra­riedades acumularam-se, e porque não diluídas conforme deveriam, explodem quando algo proporciona aumento de volume à carga existente, fazendo-a insuportável.

Ao mesmo tempo, a terapia da prece e da meditação constitui salutar recurso para o controle das emoções, reabastecimento de energias vigorosas que se encarregam de asserenar o sistema nervoso central, impedindo ou diminuindo a incidência da ira.

As boas leituras também funcionam como procedi­mento terapêutico de excelente qualidade, por enriquece­rem a mente com ideias otimistas, substituindo muitos dos clichês psíquicos viciosos que induzem a comportamentos insanos.

Em face dos recursos que se podem haurir na bioenergia, a sua aplicação, nos pacientes susceptíveis à raiva e à sua corte de distúrbios da emoção, é de inadiável impor­tância, destacando-se o concurso de pessoas abnegadas e saudáveis física e moralmente, como portadoras da doação.

Jesus utilizava-se do denominado toque curador, descarregando naqueles que O buscavam as sublimes energias de que era portador. Nada obstante, mediante a sua vonta­de, penetrava na problemática dos pacientes antes que Lhe narrassem às aflições de que eram vítimas, liberando-os com o Seu psiquismo superior.

Desde a expulsão dos Espíritos imundos que faziam estorcegar as suas vítimas em processos de aparente epilepsia ou de esquizofrenia, à recuperação de morte simulada por catalepsia, de hemorragia, de cegueira, surdez, mudez, dilacerações orgânicas, até as mais graves ocorrências a dis­tância, utilizando-se do incomparável poder de que se fazia possuidor.

Embora a imensa distância moral que medeia entre Ele e os Seus modernos discípulos, todos são possuidores de preciosas energias que dimanam do Pai, algumas das quais encontram-se ínsitas neles mesmos, ou as recebem mediante a interferência dos nobres condutores espirituais da Humanidade.

Por fim, o autocontrole que cada qual deve manter em relação às suas reações emocionais de qualquer natu­reza, disciplinando a vontade, educando os sentimentos e adaptando-se a novos hábitos saudáveis, imprescindíveis a uma existência rica de saúde.




Divaldo Pereira Franco ditado pelo 
Espírito Joanna de Ângelis



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