sexta-feira, 13 de março de 2015

PORQUE EU NÃO VOU PARA AS RUAS por Tayná Leite


Foram 54 milhões é maior que 51 milhões. A vitória foi legítima. Simples assim. Roberta Carrilho


Então, rolou panelaço. Rolou xingamento não muito nobre à presidente e tá rolando muita, mas muita incoerência, hipocrisia e falta de querer ouvir, de querer ponderar e de unir esforços contra os verdadeiros vilões: nós mesmos.

Às vezes dá um nó na garganta com as coisas raivosas que tenho lido e, confesso que por vezes (muitas) fico completamente desesperançosa de que haja alguma solução para esta que chamamos de pátria (conceito do qual tenho buscado me desapegar cada vez mais - mas isso é assunto para outro momento!).

Eu não vou às ruas no dia 13 nem no dia 15. Para mim a eleição acabou e não sou a favor do impeachment, mas considero o protesto popular uma das formas de lembrar ao governo de que todo poder emana do povo (e não de Deus como querem algum), mas o que está em pauta - no caso a queda da Presidente - não é a minha bandeira. Ando muito mais preocupada com a bancada evangélica e as sandices de Eduardo Cunha e Renan Calheiros do que com o resto.

Além disso, tendo a concordar com o senador Cristovam Buarque, de que um impeachment da presidente nada resolve, nada agrega, nada acalma. Apenas enfraquece a nossa já frágil democracia. Concordo também como ele de que a insatisfação é geral com a classe política e em tese todos - ou quase - deveriam ser removidos de seus postos. Me lembrei novamente da minha monografia na qual defendia a possibilidade de cassação de mandato pelo povo também dos membros do Legislativo e não apenas do Executivo.

Mas o que é que levou então à gota d'agua para toda essa revolta? Será que os petistas estariam agindo da mesma forma caso Aécio tivesse ganho? Estariam acusando o PSDB de estelionato eleitoral quando ele cortasse ou reduzisse o orçamento com programas sociais? Talvez sim, talvez não! Talvez estivessem apenas fazendo o que eles sempre souberam fazer muito bem: OPOSIÇÃO. Ou talvez estivessem tentando instaurar a tal da ditadura bolivariana (piadinha, tá gente!?). Difícil saber a essa altura.

Alguns amigos revoltados bradam com vigor: "ela mentiu na campanha"! Já ouvi também em várias situações que o que houve foi um "estelionato eleitoral". Esse tipo de colocação me causa tanta estranheza quanto a repressão aos protestos que muitos petistas tentam disfarçar de superioridade: "revoltinha se cura com análise e calmante" não condiz com quem tanto foi às ruas contra governos anteriores!

De um lado, "não cumprir promessas de campanha" não me parece tenha sido inovação eleitoral da sra. Dilma Roussef, muito menos protestar e pedir impeachment sempre que rola um escândalo, foi obra original desta "nova direita".

Eu não estou nem um pouco surpresa com as medidas tomadas pelo governo. Inclusive discuti com alguns na época sobre como qualquer um deles (Dilma ou Aécio) teria que tomar essas medidas que só não foram feitas antes por razões eleitorais. Aliás, só pode estar surpreso quem não acompanha minimamente o cenário econômico do país e do mundo. Surpresa mesmo estou é com a revolta de quem esperava - e clamava - por todas essas medidas para recolocar o país nos eixos com Aécio e agora tá putaço aí xingando muito no Twitter. Um tanto boquiaberta estou com a defesa dos atos do governo por parte dos que quase me mataram quando falei do tal "mercado" ("o mercado não existe! O que existe é o POVO!" foi uma das respostas que ouvi em discussões pré-eletorais) e de que ela teria que tentar acalmá-lo de alguma forma justamente tomando essas medidas. Coerência a gente certamente não vê por aqui. Até que ponto vai a ideologia partidária para levar pessoas a serem frequente e reiteradamente inconsistentes apenas para apoiar um lado, quando deveríamos estar todos do mesmo lado: o do POVO.

Por que essa revolta toda agora que ela tomou medidas que todo mundo sabia que seriam tomadas e que eram necessárias? E por que não são os meus amigos petistas que estão na rua contra o governo que "traiu" seus ideais tirando dinheiro da educação (até do Pronatec - piada pronta), aumentou impostos e nomeou um Ministério que agradasse e acalmasse o tal do mercado? Cadê o povo que compartilhou artigos acadêmicos que demonstram a ineficiência de um regime de austeridade em tempos de crise agora? Pois é... estão defendendo a austeridade... vai entender! Cadê os eleitores do Aécio felizes por ela ter tido coragem de fazer o que queriam que o PSDB fizesse - as tais "medidas impopulares", flexibilizando os benefícios dos trabalhadores que todo empresário reclama que freia a competitividade? Não tem... galera abraçou o posicionamento pré eleição e não tem a menor vergonha de mudar de argumento/fundamentação desde que não mude de lado! E ai de alguém que tente ponderar, que tente olhar o outro lado, que tente ser solidário: coxinha, petralha, bandido, corrupto, conivente, vagabundo ou em cima do muro são os adjetivos atribuídos a essas pessoas (entre as quais me incluo).

O fato é que para além da revolta, os argumentos debatidos me soam simplistas e mal explorados de ambos os lados.

Em nada ajuda o Juca Kfouri (apenas como exemplo de muitos) dizer que a revolta representa apenas "o incômodo que a elite branca sente ao disputar espaço com esta gente diferenciada que anda frequentando aeroportos, congestionando o trânsito e disputando vaga na universidade". Isso não é verdade. E esse tipo de argumento que generaliza, que diminui o outro, que ignora a complexidade do assunto, apenas empobrece o debate e faz com que muitos deixem de questionarem-se sobre suas reais inconsistências e incoerências e, porque não, verem as coisas por um outro lado. Relegar TODAS as pessoas revoltadas com o governo a um bando de playboy que não quer dividir o bolo é simplista demais e faz com que a reação instintiva do interlocutor seja descartar o argumento como um todo. A não ser que o Juca esteja escrevendo apenas para si e para aqueles que pensam como ele esse tipo de texto serve tanto quanto compartilhar vídeos e memes idiotas em grupos de Whatsapp. Ninguém vai mudar sua opinião ou refletir sobre algo porque você mandou um meme retardado ou um vídeo editado do Lula falando merda! Isso só irrita! Só afasta! Nota: se você muda de opinião por conta desses memes volte duas casas!

Por outro lado, colocar a solução de problemas tão complexos no impeachment da Dilma é tão ou mais simplista quanto. ELA não é o problema! Ela é apenas mais uma rodinha de uma engrenagem muito maior. "Ahhhh mas então você acha melhor não fazer nada?" Não, eu acho melhor fazer algo sempre! Eu acho melhor ler, se inteirar (sim você elite intelectual ao menos pode fazer isso!). Participar da política, participar de Conselhos Municipais, acompanhar votações no Congresso e pautas do STF, saber o que seus candidatos no legislativo estão fazendo e cobrar deles o que prometeram nas suas campanhas. Ok, ok, lembrar em quem você votou já seria um grande avanço!

Esses dias falei que eu estava me sentido de certa forma sensibilizada pela situação do ser humano Dilma. Comentei que fico pensando no tamanho da pressão que ela deve estar suportando, em como não deve estar sequer dormindo ou descansando. Talvez chore em um canto. Talvez se pergunte porque escolheu esse caminho da política... talvez tema pela sua segurança. Certamente ela está pagando por erros que não são apenas dela! Certamente não foi ela quem inventou a corrupção e muito menos a má administração pública! Também não foi o Lula e nem seu antecessor. O Brasil é mal administrado desde que Pedrinho botou seus pezinhos aventureiros na Bahia. Não preciso nem dizer o que ouvi como resposta né? Ajoelhou...

Mas então, para não dar uma de Juca e pregar para convertido, gostaria de fazer desse post um convite.

Um convite à reflexão genuína. De tu com tu mesmo, nem precisa compartilhar com ninguém e mostrar que está olhando para o outro lado...

O convite é olhar para si. A única forma de mudar o mundo é mudarmos a nós mesmos e a mudança só funciona de dentro para fora.

Precisamos olhar para os nossos próprios defeitos com mais honestidade e olhar para fora com mais carinho e menos julgamento! Falta olhar-se no espelho e enxergar a própria podridão e sordidez e, ao invés de apontar sempre os mesmos culpados, responder-se com a sinceridade mais cruel possível: o que VOCÊ aí do espelho está fazendo para mudar o mundo?

Como está educando seus filhos? Fala que não é machista, mas acha que mulher não pode "dar por aí" e que a sua filha tem que ser "menina para casar" enquanto seu filho é o garanhão da faculdade e ainda chama feminista de feminazi? Ou, se diz não homofóbico, mas não deixa seu filho fazer ballet "porque é coisa de menina ou de boiola?" É contra o Bolsa Família porque é populista e não ensina a pescar, mas dá aquela contribuição mensal a uma instituição de caridade porque é mais fácil do que ir lá ajudar semanalmente? Ou nem isso? É contra a desonestidade, mas cola na prova? E quantas músicas e filmes já baixou esse mês sem pagar pelos direitos autorais?

Eu te pergunto: você que está tão indignado com o petrolão, mensalão, sei lá quantos mais "ãos" o quão indignado se sente com a situação da criança que vem te pedir dinheiro no semáforo com o olhar triste e distante? O quanto te "revolta" quando passa por uma favela ou vê pessoas vivendo em condições de miséria material e emocional, completamente abandonadas pelo Estado? Quantas vezes você bateu panela pelas milhares de crianças que não estudam e sequer podem comer mais do que uma refeição por dia?

Qual o grau de dor física que te causa saber que milhões de brasileiros vivem na extrema miséria (sendo que se você ganha mais de R$ 70 aparentemente já não é mais considerado miserável!).

Você já parou para pensar no tanto de privilégios que você tem? Não me venha com: "não tenho culpa de ser homem/branco/elite". Você pode não ter culpa mas tem RESPONSABILIDADES!

Não é possível continuarmos a viver olhando apenas para o nosso umbigo. Para os nossos argumentos e para o nosso sofrimento! Acabou o iogurte no mercado: fodeu! Viramos a Venezuela. Sério! Para e pensa no ridículo desse problema perto do que milhões e milhões de brasileiros vivem e viveram por séculos. A corrupção não é novidade. Certamente ela não é novidade para quem cresceu sem saneamento básico e asfalto porque a verba nunca chegou. Ela não é nada nova para quem não teve acesso à educação básica e à saúde por séculos e décadas, muito menos para os que vivem sem água no sertão ou para os que morrem todo ano nas enchentes fluminenses. Então, não se engane dizendo que a sua revolta é com o nível absurdo de corrupção! Pois ela está aí corroendo o Brasil há séculos de formas muito mais perversas e nem por isso você gastou seu teflon com isso.

Também não podemos continuar apenas perpetuando discurso de ódio e culpando os outros pelos nossos problemas sem que nos dediquemos minimamente a aprofundar a reflexão e fazer algo para resolvê-los. Chamar o cidadão de coxinha não vai resolver em nada! Culpar o empresário que acorda cedo, paga impostos e que gera empregos também não! Muito menos ajuda defender o governo cegamente com unhas e dentes sem enxergar suas incoerências, sua hipocrisia e demagogia.

Então, vá às ruas no dia 13 ou no dia 15 e demonstre sua posição. Vá em paz e proteste! Mas lembre-se: nem o impeachment nem o status quo resolverão o problema! A única coisa que vai iniciar a mudança verdadeira é o olhar para primeiro para si, depois para o outro com atenção e empatia. É sair da cadeira e da frente do computador e agir. É ler, estudar, empoderar, ocupar o espaço público... cobrar os políticos mas também votar com consciência e (de preferência IR VOTAR). Você pode achar que o maior problema do Brasil é a corrupção, mas não é. O maior problema do Brasil é o individualismo. A corrupção é apenas sintoma de uma causa muito mais podre e pobre!

Post originalmente publicado em: http://www.selfdh.com



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