sábado, 6 de dezembro de 2014

UM HOMEM ADMIRÁVEL PABLO VILLAÇA



PABLO VILLAÇA - crítico de cinema, belorizontino, mineiro que a cada dia 
mais encantada com seus textos e sua pessoa.


Pablo Villaça perfeição não é possível ainda neste estágio da civilização humana. Porém, é impossível não gostar de você por você mesmo. Não podemos deixar de reconhecer o mérito e seu caráter em ser assim um homem ideal na sua imperfeição. Raro e desejado por muitas pessoas que hoje estão famintas de sinceridades e honestidades. Você é sim um homem admirável. Abraços, Roberta Carrilho




Ontem, publiquei um texto sobre a importância da empatia no que diz respeito a causas diferentes das nossas e recebi diversos elogios nos comentários abaixo do post. "Mais homens deveriam ser como você!", "Ah, se todo homem pensasse assim!", "Finalmente um homem razoável!" e por aí afora. 

Estes comentários, por mais generosos que tenham sido (e foram muito), me fizeram mal. Senti-me incomodado, inquieto, com um nó no estômago.

E finalmente percebi que este efeito poderia ser explicado por minha aversão ao plágio.

Explico: como escritor, sempre digo que o crime mais ofensivo que alguém pode cometer contra um profissional da área é o plágio. Um crime, aliás, cuja motivação nunca consegui compreender: deve ser horrível receber elogios por algo que não se criou - e ainda pior ser criticado por um texto que pertence a outro. Você pode amar ou detestar os textos que publico, mas eles são meus. Ser louvado sem merecer é uma experiência que eu abominaria.

Daí o nó no estômago com os elogios recebidos pelo último post.

Não, não estou dizendo que plagiei o texto; ele é meu. Mas os elogios com os quais fui presenteado definitivamente não eram merecidos.

Eu queria muito ser "um homem raro". Um "exemplo". Um modelo de comportamento masculino.

Mas não sou.

Sim, seria fácil permanecer calado e receber o calor gentil dos cumprimentos - e sei que há muitos que escrevem textos calculados para provocarem este tipo de efeito. Não se iludam: conheço os truques da profissão e saberia perfeitamente escrever algo com o único objetivo de projetar uma imagem nobre ou inspiradora. Recentemente, por exemplo, vários leitores pediram um texto sobre a morte de Roberto Bolaños e, por alguns segundos, pude antever frases de efeito, confissões pessoais sobre sua importância em minha vida e o compartilhamento de risos e impressões.

Mas eu estaria sendo um hipócrita, pois o fato é que assisti a pouquíssimos episódios de "Chaves" e, mesmo reconhecendo seu alcance e sua graça, não tinha uma ligação particularmente forte com a obra do mexicano. Assim, permaneci mudo e deixei que outros que realmente tinham esta ligação afetuosa com Bolaños presenteassem seus leitores com reminiscências calorosas (como fez brilhantemente Gregório Duvivier).

Não, não escrevo para projetar uma imagem falsa de perfeição. Ao contrário: em várias ocasiões, eu antevi problemas que teria com certos textos e ainda assim os escrevi quando teria sido melhor para minha saúde permanecer com a tela do computador em branco. De novo: inspiradores ou irritantes, meus textos expressam o que penso e quem sou.

E definitivamente não sou um "exemplo de homem". E ser elogiado por isso seria injusto e ofensivo. Até tentei me justificar para minha própria consciência com um "pelo menos, não sou como o tal blogueiro!", mas isto é usar um padrão muito baixo de comparação. Se preciso disso para me sentir bem comigo mesmo... a coisa vai mal.

Nunca assediei mulheres, obviamente. Se um convite para um encontro era recusado, eu não insistia. No máximo, o repetia mais uma vez em outra ocasião (caso inicialmente tivesse recebido apenas silêncio como resposta) e pronto. "Não" é "não". Tampouco enviei fotos íntimas por supor que a pessoa do outro lado precisava urgentemente ver meu pênis em duas dimensões em seu telefone ou computador. E jamais me entreguei a fetiches agressivos unilaterais, que visavam meu prazer às custas da pessoa com quem me encontrava, fossem estes físicos ou verbais. E, claro, não persegui menores de idade.

Mas o fato de não ser misógino (ou desumano) não quer dizer que não posso agir como um babaca.

E já agi. Como agi. Contei mentiras, magoei pessoas que não mereciam ser magoadas (ok, ninguém merece), cometi traições e, sim, objetifiquei mulheres. Em alguns casos, pedi desculpas ao me dar conta do que havia feito. Em outros, apenas me afastei. Ou mesmo só percebi a gravidade da mágoa ao constatar a raiva inspirada. Algumas desculpas foram aceitas. Outras não. E também compreendo.

De modo geral, mantenho bons relacionamentos com todas as minhas ex - incluindo aquela que namorei aos 17 anos e que ainda hoje permanece uma amiga querida. No entanto, sempre acreditei que é cômodo demais nos definirmos por nossas virtudes.

O maior teste de caráter é tentar se definir por suas maiores falhas e avaliar se ainda assim você pode se considerar uma pessoa digna de elogios.

E, infelizmente, não, não posso.

Portanto, devolvo, com pesar, os elogios com os quais me presentearam no post passado. Guardem-nos para alguém que mereça. O que escrevi era apenas fruto de bom senso - um bom senso com o qual tento me comportar na maior parte do tempo.

Mas que já falhou vezes demais para que eu possa ter orgulho de mim mesmo.

Assim, peço que, por favor, não cometam o equívoco de encarar este post como um texto de "parabenizem minha valentia por reconhecer minhas falhas". Não há valentia alguma aqui. Há arrependimentos, remorsos e um esforço genuíno pra tentar seguir melhorando como ser humano e evitar novos erros.

No post passado, escrevi sobre os privilégios do homem cis hetero e branco - e um exemplo destes ocorreu no twitter na semana passada, quando, como maneira de demonstrar apoio à população negra dos Estados Unidos, revoltada com mortes seguidas de jovens desarmados graças à brutalidade policial, vários usuários começaram a postar crimes que haviam cometido, maiores ou menores, e pelos quais não foram responsabilizados por serem brancos.

E foi aí que um usuário negro comentou: "Privilégio branco é você confessar um crime no Twitter e ser aplaudido por sua valentia".

Perfeito.

Não cometam este erro aqui.
Pablo Villaça






Biografia: Pablo Villaça
Nascimento em 18 de setembro de 1974

  • Descrição curta
    Crítico de cinema desde 1994, é diretor-fundador do portal Cinema em Cena e autor do livro "O Cinema Além das Montanhas". Diretor e roteirista dos curtas "A_ética" e "Morte Cega".
  • Biografia
    Crítico de cinema desde 1994, colaborou com publicações nacionais comoMovieStar, Sci-Fi News, Sci-Fi Cinema, Replicante e a SET. Em 2002, tornou-se o único membro latino-americano a fazer parte da prestigiada Online Film Critics Society, sediada em Nova York. Publicou colunas em inglês no site Hollywood Elsewhere e atualmente colabora com o renomado Movie City News, além de ser o único brasileiro a ser citado pelo Rotten Tomatoes, o mais famoso portal de críticas da Internet. Em 2005, lançou seu primeiro livro, “O Cinema além das Montanhas”, biografia do cineasta Helvécio Ratton. Em 2001, venceu o prêmio teatral SESC-SATED de Melhor Texto Adaptado. Também foi apresentador e roteirista do programa Cinema em Cena, que foi ao ar durante dois anos pela TV Horizonte.

    Atualmente, além de Diretor do Cinema em Cena (o qual criou em 1997), é também professor de Linguagem e Crítica Cinematográficas em curso ministrado em mais de dez cidades em todas as regiões brasileiras ao longo de 30 edições. Em 2007, foi o único profissional estrangeiro, entre 15 convidados, a participar em Nova York de um seminário sobre Crítica promovido pelo jornal The New York Times e pelo Museum of the Moving Image. Em 2008, dirigiu seu primeiro filme, o curta-metragem A_Ética, que marcou o lançamento da Cinema em Cena Produções. Em 2009, atuou temporariamente em Los Angeles, atendendo a convite especial, como diretor do International Film Institute.

    Em 2011, foi convidado pelo crítico norte-americano Roger Ebert, um dos mais respeitados do mundo e vencedor do Pulitzer, para ser um dos críticos “Correspondentes Estrangeiros” em seu site oficial hospedado pelo jornal Chicago Sun-Times. No mesmo ano, foi chamado por Ebert para participar de um debate sobre Crítica Internacional na 13a. edição de seu festival anual ambientado na cidade de Champaign-Urbana, em Illinois, e também para conduzir uma entrevista com o cineasta Oliver Schmidtz sobre seu filme Life, Above All.

    Em 2011, também foi eleito por seus colegas da OFCS para o cargo de Diretor da associação – o primeiro membro de língua não-inglesa a ocupar a função.

    Em 2012, finalizou seu segundo curta, Morte Cega, e foi novamente convidado por Roger Ebert para participar do Ebertfest 2012 como debatedor na noite de abertura do festival, entrevistando o diretor de fotografia Stephen Goldblatt, duas vezes indicado ao Oscar, no palco do Virginia Theater. Participou também da mesa-redonda sobre Cinema Internacional e deu uma master class sobre “Film Studies” para os alunos da Universidade de Illinois como convidado especial da instituição.
  • Prêmios
    SESC-SATED 2001: Melhor Texto Adaptado para o Teatro (Gênero: Infantil)
  • Gênero
    Masculino




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